Há uma água clara que cai sobre pedras escuras
e que, só pelo som, deixa ver como é fria.
Há uma noite por onde passam grandes estrelas puras.
Há um pensamento esperando que se forme uma alegria.
Há um gesto acorrentado e uma voz sem coragem,
e um amor que não sabe onde é que anda o seu dia.
E a água cai, refletindo estrelas, céu, folhagem...
Cai para sempre!
E duas mãos nela mergulham com tristeza,
deixando um esplendor sobre a sua passagem.
(Porque existe um esplendor e uma inútil beleza
nessas mãos que desenham dentro da água sua viagem
para fora da natureza,
onde não chegará nunca esta água imprecisa,
que nasce e desliza, que nasce e desliza...)
Cecília Meireles
do livro Viagem 1.939
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