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16 de mar. de 2010
Trinta anos no vale de exílios da sombra
Trinta anos no vale de exílios da sombra,
tua voz se eleva cintilante, responde-me
com seus cristais clarificados, - e sem nenhum rumor.
Fica repleta a noite e meus ouvidos te reconhecem:
os ouvidos que nem estão no meu corpo
nem na memória, mas só no ausente universo do sono.
Eu te digo: “Espera-me! Desculpa-me!
Vou chegar muito tarde!” E não sei se falo
com palavras ou símbolos, nas dimensões submersas do horizonte.
E eu te digo: “Atira-me a chave!” E deploro-me –
e de muito longe vejo a chave que me atiras,
e que receberei como álibi do sobrenatural.
Assim, eu sou agora, ainda que a mesma, também outra,
em mundo paralelo, com a chave da porta invisível,
e o som da tua voz é uma arvore clara que não se ouve,
numa atmosfera absurda –
como se nos fossemos encontrar, um dia, e continuássemos.
Abril, 4, 1963
Cecília Meireles
In: Poesia Completa
Sonhos (1950-1963)
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