4 de mai. de 2010

Busca da rosa


Há longos labirintos, fontes frias,
lábios sem rosto, sinos de doçura,
mas verdes solidões e na espessura
deste bosque onde vou perdendo os dias.
Vim no alado cavalo da Aventura,
ungida por meus votos e magias.
Vim, mas vejo-me só – porque as esguias
asas fugiram, procurando altura.
Insisto nesta busca vagarosa.
Quero ouvir, entre sombra e soledade,
o eco, o arroio, a cascata, a alma do mar
dizerem onde se elabora a rosa
sem morte, sem desejo e sem saudade
que vim de longe para contemplar.


Onde a pessoa encontra um vulto que não é o da rosa


Resigno-me a deixar pender meu rosto
sobre a fonte de encantos que desliza
nestas escuridões – e sinto o gosto
de tua vida: onda, frescura e brisa.
Mas logo vejo armar-se uma imprecisa
sombra de fora, denso muro oposto
a essa doçura – e avança, e escura pisa
mesmo a alegria do meu claro rosto.
Ah! não te posso amar, enamorada
perpetuamente, no êxtase da vida!
Esta é a pausa distante do meu peito.
Não padeças – que eu não te peço nada.
Nem se fica infeliz, por dolorida,
a vagar nestes bosques do Imperfeito.



Cecília Meireles
In: Poesia Completa
Dispersos (1918-1964)

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