Algum tamanho e peso.
Densidade para as quedas.
No entanto, alguma luz.
As peças anatômicas em seus lugares certos.
Nada porem digno de extrema admiração:
Nem Apolo nem Adônis.
Personagem, porém, personagem.
Olha, vê, não vê, não sabe, não se sabe o que vê e não vê.
Fala, pensa, não pensa, não sabe, nem se sabe, se pensa e não pensa.
Olha, fala.
Move-se.
Ele mesmo não sabe, para onde.
Move-se contraditório
com os pés na terra, mas a cabeça
e num mundo invisível de mil pólos.
Personagem: sente-se, não se sente, não se sabe nem sabe como e por quê.
Pode estar em tantos lugares,
pode ser tantas vidas.
Homem, animal, planta, pedra,
tudo que inventar e quiser.
Poderá ser deus?
Sonha-se.
Personagem de cidades e eras arbitrarias,
com os seus idiomas confusos
em labirintos de idéias, de heranças, de ímpetos.
Ama, desama,
desmonta seus mecanismos, de repente, devagar.
Por quê? Sabe, não sabe, decide, arrepende-se.
Tem lagrimas inesperadas, alegrias –
quando ficar triste? quando vai ser feliz?
Personagem que lembra e esquece querendo e sem querer.
Tem quatro pés, dois pés, três pés.
Depois continua a marchar sem necessidade de pés,
e voa sem ter asas.
Com densidade para as quedas
e presságios de luz.
todos os dias são de êxodo
para um lugar que a Esfinge se esqueceu de dizer.
Permite, dolorido personagem.
1961
Cecília Meireles
In: Poesia Completa
Dispersos (1918-1964)
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