Seja bem-vindo. Hoje é
9 de abr. de 2010
Epigramas
I
À bela dama despojada
não lhe restava mais nada,
depois de batalhas ávidas.
Continuava, porém, tão bela,
que inveja dizia: “Àquela
ainda lhe restam as perolas...”
A bela dama despojada
não podia dizer nada.
(Não lhe restavam nem lagrimas.)
II
Não há rosto nenhum! E mesmo o meu, que importa?
E as mãos! – as mãos foram um desenho sem sentido.
Um dia sonhamos que existimos.
Vivemos desse sonho.
E dentro dele fomos tão desgraçados...
Quando recordaremos esse sonho sonhado?
Onde recordaremos esse sonho acabado?
Quem seremos, depois dessa antiga aventura,
e em que abismos de lembrança
despiremos, afinal, esta couraça tênue de vida,
esta opressão e esta fragilidade,
este martírio vago e perseverante da memória?
III
Sobre uma flor dormiríamos
e o vento nos dividiria com suas numerosas laminas.
Sobre uma flor. Sem rastros.
Sem espelho. Sem nome.
Ah! mas em que translúcido tempo?
IV
Não descerias em mim, porque a minha torrente
desmancharia o teu frágil momento
no rápido transito.
Fica só refletida, e as ondas que passarem
todas irão levando a ausência do teu rosto,
que será presença sem fim.
Não queiras ter a morte inglória dos encontros.
Mas a eterna, a profunda vida, no reflexo
que por onde passar te levará.
Cecília Meireles
In: Poesia Completa
Dispersos (1918-1964)
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Seja bem-vindo. Hoje é
Aiii que linndo! Deixou o meu coração um pouco angustiado.
ResponderExcluirPoesia que se mistura com a vida, vida que se mistura com a poesia.
Não queiras ter a morte inglória dos encontros.
Mas a eterna, a profunda vida, no reflexo
que por onde passar te levará.
Beijos
Glória
Maravilhas!
ResponderExcluirCecília eterna!
ResponderExcluir