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21 de abr. de 2010

Fala-me agora, que estou cansado

(GUILLAUME SEIGNAC - França-1870 - 1924)


Fala-me agora, que estou cansado,
agora, que já voltaste, e conheces o mundo,
de cada lado.


Fala-me como alguém que já sabe da vida
e da sua seiva mais tenebrosa
e que transporta sua alma partida.


Fala-me como se a morte amanhã chegasse
e pusesse a fria coroa da lua
sobre a tua face.


Fala-me e dize que me ouviste um dia,
e que estavas só, perdido, acabado,
e tiveste alegria.


Fala-me, enfim, como nunca no mundo
ninguém já falou a um irmão, a um amigo
- abre o teu coração até o fundo.


Para que eu morra com o contentamento
de que o meu amor não foi um dom perdido,
lágrima no mar, suspiro no vento.


Que se pode ainda amar como em sonhos antigos,
sem mãos e sem voz, sem olhos, sem passos,
além de glórias e perigos.


Fala-me como alguém que me viu tão de frente
que eu não posso saber se é o meu próprio retrato
num espelho clarividente.



Cecília Meireles
In: Poesia Completa
Dispersos (1918-1964)

Um comentário:

  1. Meu Deusss... Às vezes, a sintonia é assustadora!
    Pois, pouco tempo atrás, eu tive pensamentos que queriam se transformar em palavras sobre a morte. A morte dos sentimentos, a morte de antigas verdades, a morte do tempo, a morte de ser ou não ser.Mas, a morte no sentido de renascimento, é isto que eu tentava escrever.
    A energia está no ar!

    Beijos

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