30 de mai. de 2012

'Manhã de chuva na infância'


Ao longo do muro, as campânulas escorrem,
gelatinosas,
ainda coroadas,
ainda cheirosas,
e já mortas.


Eu sou a menina que vai para a escola
com o seu casaquinho vermelho,
e os seus livros forrados de papel azul.


A chuva continua a bater nas flores,
a avivar as cores dos muros,
a gorgolejar nas calhas,
a correr para os negros bueiros.


Eu sou a menina que vai para a escola
feliz, com os cabelos molhados
e o rosto frio.


A chuva é uma alegria, com suas agulhas de vidro
voando por todos os lados.
A chuva cheira a jasmim e a flor “boa-noite!”


Eu sou a menina que de repente fica triste,
porque ao longo do muro as campânulas escorrem,
gelatinosas,


cor de coral, cor de marfim,
perfumadas ainda,
e já mortas.

1957



Cecília Meireles
In: Poesia Completa
Dispersos (1918-1964)

Um comentário:

  1. Amo cada palavra que encontro neste blog o amo de coração quando estou triste, corro para aqui quando feliz também, ele simplesmente de divino, obrigada.

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