4 de out. de 2013

Renúncia



Rama das minhas árvores altas,
deixa ir a flor! que o tempo, ao desprendê-la,
roda-a no molde de noites e de albas
onde gira e suspira cada estrela.

Deixa ir a flor! deixa-a ser asa, espaço,
ritmo, desenho, música absoluta,
dando e recuperando o corpo esparso
que, indo e vindo, se observa, e ordena, e escuta.

Falo-te, por saber o que é perder-se.
Conheço o coração da primavera.
e o dom secreto do seu sangue verde,
que num breve perfume existe e espera.

Verti para infinitos desamparos
tudo que tive no meu pensamento.
Era a flor dos instantes amargos.
Por onde anda? No abismo. Dada ao vento...


Cecília Meireles
In Viagem, 1.938






2 comentários:

  1. Um dos mais lindos de Cecília. Adoro vir aqui, pois amo Cecília!

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  2. De seu pórtico poético, lá onde se a alma fala, a poetisa deixa espargirem-se, numa insólita magia, pelo espaço infinito do seu sentir, de forma tênue e, a um tempo, febril, as vibrações de sua imaginação fecunda, profundamente...

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