4 de nov. de 2013

Esta que em silencio


  
Esta que em silêncio
abaixa a cabeça
e escreve uma carta
anda tão cansada
de entregar ao mundo
mensagens de amor
que até as tulipas
perto do seu rosto
lágrimas escorrem
e de pesarosas
têm corações negros.

Que até uma brisa
que vinha passando
parou nos seus lábios,
não se moveu mais.
Manso beijo aéreo
de um céu compassivo.

Que até as palavras 
que vai escrevendo 
vão tomando formas
de nuvens errantes,
de ondas pressurosas
para a espuma e areia,
de passos humanos
em longos desertos
onde é sempre novo
o horizonte, e o mesmo...

Ah! terrena vida,
estranha aventura,
rumo involuntário,
perspectiva surda. 
 

Cecília Meireles
In: Poesia Completa
Dispersos (1918-1964)

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