19 de mai. de 2009

Cavalgada



Escuta o galope certeiro dos dias
saltando as roxas barreiras da aurora.

Já passaram azuis e brancos:
cinzentos, negros, dourados passaram.

Nós, entretidos pela terra,
não levantamos quase nunca os olhos.

E eles iam de estrela a estrela,
asas, crinas e caudas agitando.

Todos belos, e alguns sinistros,
com centelhas de sangue pelos cascos.

Se alguém lhes suplicasse:"Parem!"
- não parariam - que invisível látego

ao flanco impôs-lhe ritmo certo.
Se por acaso alguém dissesse: "Voem!

Mais depressa e para mais longe?"
- veria o que é, no céu, a voz humana...

Escuta o galope sem pausa
da cavalgada que vai para oeste.

Não suspires pelo que existe
nesses caminhos do sol e da lua.

Semeia, colhe, perde, canta,
que a cavalgada leva seu destino.

Ferraduras, ígneas virão
procurar onde estás, na hora que é tua.

Entre essas patas de aço e nuvem,
estão presos teus campos e teus mares.

Irás ao céu num selim de ouro,
sem saberes quem pôs teu pé no estribo.

Rodarás entre a poeira e Sírius,
com esses ginetes sem voz e sem sono,

até vir o mais poderoso
que esmague a rosa guardada em teu peito.

Depois, continuarão saltando, mas tão longe
que não perturbarão tuas pálpebras soterradas.

Cecília Meireles
In: Canções -1956-

3 comentários:

  1. Obrigaga Cecilia, pela generosa percepção do passar do tempo e da vida.

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  2. Cecilia Meireles foi uma grande pessoa e ainda é,gostei muito do poema "CAVALGADA"!Adorei a parte : Escuta o galope certeiro dos dias saltando as roxas barreiras da aurora

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