16 de ago. de 2010

Dias da rosa



A Lúcia Machado de Almeida


No primeiro dia, foi apenas um mistério de seda e nácar.
Fechada como um sono.
Uma abelha rodava, descobrindo-a.
O resto ficava desatento àquele silencio.


No entanto, cada minuto se movia naquela haste,
invisível e ativo:
ali também reinava o tempo.


No segundo dia, foi como um sorriso,
um olhar levantando pálpebras translúcidas,
um rosto aparecendo na sombra, redondo e claro.
E ninguém podia deixar de ser alegre, vendo-a.


No terceiro dia, todas as suas sedas se expandiram.
Parecia uma voz, um cântico.
Pensei que fosse morrer, nessa abundancia,
mas apenas se debruçava em perfume.


E, como borboletas ou pássaros,
as pessoas vinham sentir, extasiadas,
seu aroma de fruta e mel.


(O ar estava mudado: tudo eram ímãs de frescura.)


No quarto dia, deixou cair subitamente
Aquela gloria de aromas e sedas,
aquele vestuário efêmero e radioso.
Ficou sendo somente um coração coroado
com leves espinhos eternos de ouro.


Mas ninguém mais amava essa infinita beleza póstuma.
O esquema secreto da vida, que ali se manifestava:
inicio, biografia, continuação!


Cecília Meireles
In: Poesia Completa
Dispersos (1918-1964)

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